A transição energética global enfrenta um entrave significativo causado pela concentração das patentes em tecnologias verdes nas mãos de poucos países e empresas. Esse cenário dificulta o acesso e o desenvolvimento dessas tecnologias para nações do Sul Global, que são as mais impactadas pela crise climática, mas detêm uma participação mínima no mercado internacional de patentes. A dependência tecnológica e os altos custos impostos pelo regime internacional de propriedade intelectual limitam o protagonismo do Brasil e de outros países periféricos na transição ecológica.
A concentração das patentes em energia eólica e solar demonstra o desequilíbrio do mercado global de tecnologias sustentáveis. Dados recentes apontam que entre 2000 e 2024, apenas dez países são responsáveis por mais de 81% dos registros internacionais de patentes em energia eólica, enquanto no setor solar cinco países detêm 77% dos pedidos. O Brasil, apesar de ser o país da América Latina e África com mais pedidos nesses setores, representa apenas 0,4% dos registros em energia eólica e 0,19% em energia solar. Essa disparidade reforça a vulnerabilidade tecnológica da região diante dos desafios climáticos.
O regime internacional de propriedade intelectual, sobretudo o acordo TRIPS da Organização Mundial do Comércio, protege fortemente as patentes, restringindo mecanismos que poderiam favorecer a transferência de tecnologia para países em desenvolvimento. Essa blindagem reforça a dependência tecnológica e econômica do Sul Global, dificultando o avanço de suas indústrias sustentáveis e perpetuando desigualdades. O economista Ha-Joon Chang descreve essa dinâmica como um “chutão da escada”, na qual os países desenvolvidos adotaram práticas protecionistas até alcançar o topo e depois restringiram seu uso para os demais.
Para superar essas barreiras, países do Sul Global têm proposto medidas como o licenciamento compulsório de tecnologias verdes, que permite a produção dessas inovações sem a autorização dos detentores das patentes em situações de interesse público. Outra proposta mais radical é a criação de um regime internacional de bens públicos globais para tecnologias da transição ecológica, eliminando a possibilidade de patenteamento dessas tecnologias para garantir seu acesso universal. Essa abordagem visa acelerar a resposta global à crise climática, permitindo que países em desenvolvimento adotem soluções sustentáveis sem enfrentar barreiras econômicas.
No cenário brasileiro, apesar do crescimento da geração de energia eólica, especialmente no Nordeste, o país não figura entre os maiores depositantes de patentes no setor. Além disso, o Brasil tem apresentado uma queda significativa nos investimentos em inovação tecnológica para energias renováveis, consequência do desmonte de fundos públicos voltados para ciência e tecnologia. A retomada recente desses investimentos ainda é insuficiente e convive com um crescimento paradoxal do setor de combustíveis fósseis, revelando uma contradição na política energética nacional que pode comprometer a transição ecológica.
A dependência tecnológica e a baixa participação do Brasil nas patentes em energias renováveis limitam sua capacidade de inovar e se posicionar como protagonista no desenvolvimento sustentável. Sem políticas públicas robustas que incentivem a pesquisa, o desenvolvimento e a exigência de transferência de tecnologia nas negociações com investidores estrangeiros, o país continuará vulnerável às decisões e ao controle de multinacionais que dominam o setor. Investir em inovação e em políticas industriais é fundamental para aumentar a autonomia tecnológica e reduzir desigualdades no acesso às tecnologias verdes.
A concentração internacional de patentes em tecnologias sustentáveis representa, portanto, um obstáculo não só econômico, mas também político e social para a justiça climática global. Países do Sul Global, como o Brasil, enfrentam o desafio de romper essa dependência e construir um modelo próprio de desenvolvimento baseado em inovação local, cooperação internacional e políticas públicas efetivas. A transição energética justa requer a democratização do acesso às tecnologias, condição essencial para acelerar a mitigação dos impactos ambientais e promover o desenvolvimento sustentável.
Em resumo, as patentes de tecnologias verdes travam a transição energética no Sul Global e impõem desafios complexos para o Brasil. A concentração das inovações em poucas mãos restringe o acesso e eleva os custos para países periféricos, limitando sua participação na revolução energética. Superar esse entrave exige mudanças no regime internacional de propriedade intelectual, investimentos em pesquisa e políticas de incentivo à inovação nacional. Só assim será possível garantir uma transição energética inclusiva, que atenda às demandas ambientais e sociais do presente e do futuro.
Autor: Roger Tant